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O Estado Criativo Natural

O Estado Criativo Natural
Kisarum Alexandre
ago. 1 - 6 min de leitura
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Entre tantos fatores que nos separam do nosso poder de criação, a falta de uma real percepção da realidade é, talvez, a mais significativa. 

 

É também um bom ponto de partida.

 

O ser humano é o único animal que, ao invés de seguir seu código genético, ativa e modifica a realidade ao seu redor. Sua consciência não só permite refletir sobre a realidade, mas permite pensar sobre o próprio pensamento, sobre a própria pessoa pensante - autoconsciência.

 

A subjetividade, que se trata da realidade modificada, nos projeta a um mundo previsível, perfeitamente desenhado com base nas próprias experiências e expectativas de realizar desejos que a nós foram impostos. Desconsiderando a complexidade da vida na qual nossa cognição não está aberta a receber.

 

Resultado de uma mente condicionada pela construção social que de longe entende como co-criar em sociedade, consolidada por um sistema educacional indisposto ao pensamento crítico. Nosso sistema ativador reticular, ao balizar a percepção da realidade objetiva, e o algoritmo, ao escoltar nossas experiências virtuais, completam o que poderíamos chamar de: os quatro sabotadores da criatividade.

 

1. Construção Social

 

Já no início do século XX, L.S. Vygotsky buscava compreender a formação da consciência como um processo social, sendo o pioneiro no conceito de que o desenvolvimento intelectual das crianças ocorre em função das interações sociais e condições de vida. Em seu livro Mind in Society, 1978, Vygotsky viria a dissertar que a consciência não poderia ser vista unicamente como resultado do desenvolvimento da espécie ou como algo que simplesmente brotou, mas sim como consequência de um processo demorado, condicionado pelo desenvolvimento de produtos sociais.

 

O sentido no qual se desenvolve o pensamento não é do individual ao social, mas ao revés. A aprendizagem seria uma forma de apropriação do patrimônio cultural disponível, e não apenas um processo de assimilação individual.

 

Iniciamos nossa interação com o mundo externo com base na imitação - fala mamãe; manda beijo; dá tchau. - e no desenvolver do nosso processo cognitivo e conquista de uma tênue individualidade, emerge a autoconsciência. É onde deveríamos iniciar um processo de desconstrução de nossa própria identidade, abstrair ao condicionamento referido e revelar o que nos é autêntico. E qual é o desafio? Sobreviver ao sistema educacional.

 

2. Sistema Educacional

 

Em plena transformação digital, todos os anos, inserimos milhares de crianças em processo de formação cognitiva dentro de salas de aulas projetadas no Século XIX. Esse ambiente, como conhecemos na maior parte do mundo, teve sua origem na era da Revolução Industrial, foi concebida com a ideia de aplicar o modelo das fábricas no ambiente escolar. Está obsoleto e precisa ser reestruturado a fim de tornar a jornada educacional um espaço que desenvolve as capacidades dos alunos, e não os condicione.

 

Com o intuito de gabaritar a prova no vestibular, os alunos são expostos ao mesmo conteúdo pelo mesmo espaço de tempo, sem levar em consideração a individualidade que carrega cada um. O resultado é o que vemos hoje: uma geração frustrada em todas as áreas da vida, sem perspectivas e desprovida de pensamento crítico e habilidades necessárias para os dias atuais.

A metodologia que padroniza o conhecimento, afasta o aluno cada vez mais da sua originalidade e autenticidade, mata a criatividade. É preciso deixar de lado a necessidade de estar na média em todas os assuntos e propor um ambiente onde se possa explorar as fortalezas, aprofundar o conhecimento de interesse de cada aluno.

 

3. Sistema ativador reticular

 

É o sistema responsável por filtrar a informação absorvida pela nossa mente, ele garante que aquilo a que você dá mais importância será mais facilmente percebido pelo seu cérebro no dia-a-dia. Por um lado, ele nos apoia a manter o foco e estruturar hábitos que melhoram a nossa produtividade, por outro, pode não indexar informações importantes ao pensamento crítico.

Você já deve ter passado pela experiência de ter alguma pessoa próxima grávida, e ao sair na rua ver mulheres grávidas e bebês por todo lado. Assim como pode ter pensado em comprar um carro e, de repente, vê esse mesmo carro por todo o lado. Isso não significa que todas as mulheres engravidaram ao mesmo tempo e nem que todo mundo resolveu comprar o mesmo carro que você. Essa realidade sempre existiu, mas você não estava apto a percebê-la.

 

A informação que existe à nossa volta não pode ser toda absorvida pelo cérebro, o S.A.R só deixa entrar o que nós indicarmos como importante, ou seja, informações que reforçam nosso ponto de vista sobre as coisas. Tudo que questione, amplie ou modifique a nossa percepção da realidade, é descartado.

 

4. Algoritmo

 

Seguindo a mesma premissa do S.A.R, temos o algoritmo. Nossa forma de consumir conteúdo na web não é cronológica e nem livre de filtros. O que recebemos em termos de informação é programado com base em nossos interesses, deixando de fora conteúdos importantes que possam nos apresentar outras perspectivas.

Quando você dá like em uma foto de cachorro em sua rede social, a sua timeline te entregará muito mais fotos de cachorros, por entender que é do seu interesse. Ao mesmo tempo que te proporciona uma melhor experiência dentro da plataforma, te priva de informações que possam ampliar o seu repertório, reduzir o seu condicionamento.

 

Ao dar-se conta de todos os mecanismos atuantes, percebemos cada vez mais que o caminho que seguimos não está baseado no livre arbítrio, e sim na realidade já pré estabelecida. Ao entrar no Netflix, por exemplo, não estamos de fato decidindo qual filme assistir, na verdade estamos sendo induzidos pelo algoritmo a ceder aquele filme já filtrado na página inicial, com uma arte projetada com base nos meus desejos de consumo.

 

É preciso desconstruir a própria identidade, pois a subjetividade nos projeta a um mundo previsível, onde a criatividade não se manifesta de maneira genuína. Em outro momento voltamos a falar a respeito.


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